sábado, 29 de junho de 2013

Areia e Pedra

Recomeçar não é um ato pontual. Uma vida nova não se faz da noite para o dia. Começar de novo é um processo, que inclui derrubar tudo (ou quase tudo) que estava de pé anteriormente e não tem espaço na nova etapa. Daí você vai construindo castelos de areia. Alguns vão ser pequenos, outros vão desmoronar, outros vão ser grandes - e vão acabar não durando muito também. Daí, uns poucos, dois ou três, vão ficar de pé, deixar de ser areia e tornar-se pedra. Então estará lá, depois de muito trabalho, a vida, recomeçada.

Texto originalmente publicado no meu Facebook, no dia 3 de maio de 2013.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Memórias


Algumas memórias são tão ou mais complexas que aqueles que as geraram.

Memórias podem nos trazer felicidade, tristeza, ou até aquele sabor agridoce que a gente ama odiar e odeia amar.
Memórias são difíceis, eu diria impossíveis de segurar, de reter. Por outro lado, elas sempre estão lá. Memórias são fluidas, são água. Água cristalina e água barrenta, ao mesmo tempo.
Memórias podem ser explosões nucleares, que nos amputam membros, nos tiram do eixo de maneira quase que irreversível. Não dá para negar, também, que memórias podem ser quase que sagradas, angelicais dentro de sua demonice.
O mais importante de tudo é que memórias podem estar sempre com a gente, por mais que doa - ou faça bem. Aqueles que as geraram, por outro lado, nem sempre podemos permitir que eles dancem pela vida com a gente.


Texto originalmente publicado no meu Facebook, no dia 22 de abril de 2013, como interpretação pessoal do vídeo acima, Thought of You,de Ryan Woodward.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Os Ícones Visuais dos Protestos

Quando nos vemos em um momento de protesto, em qualquer lugar do mundo que seja, o grupo de manifestantes, de algum maneira, se identifica visualmente. O movimento punk tinha sua unidade visual característica, bem como os caraspintadas. Em passeatas pela paz, muito comuns na primeira década do século XIX, estampas do movimento Gabriela Sou da Paz se faziam presentes em numerosas camisetas brancas.
Atualmente, o Brasil se encontra num momento de altíssima agitação popular, especialmente durante o mês de junho, quando milhões de manifestantes foram às ruas protestar por diversas causas, sendo as principais delas o aumento das passagens do transporte público e a PEC 37. Ambas as reivindicações foram atendidas, mas os manifestantes garantem que é só o começo.

Bem como em qualquer outro momento de agitação política, esse grupo, por maior que fosse, encontrou diversos meios para se identificar visualmente. No dia 16 de junho, quando 100 mil pessoas ocuparam a Avenida Rio Branco, uma das principais vias do centro do Rio de Janeiro, foi combinada via Internet uma manifestação quase silenciosa: a Segunda-Feira Branca. Muitos dos manifestantes por todo o Brasil escolheram peças de cor branca para irem aos protestos. Mesmo aqueles que não puderam ou não quiseram comparecer às manifestações foram trabalhar, estudar ou simplesmente andar na rua mostrando sua bandeira na cor de suas roupas. Nas redes sociais, como Facebook e Instagram, a hashtag #SegundaFeiraBranca, também adaptada para #WhiteMonday foi um sucesso.
A máscara estilizada de Guy Fawkes, utilizada pelo personagem título do filme V de Vingança, é outra marca do movimento, especialmente para representar o grupo de ativismo online Anonymous. Nas lojas de fantasia do centro do Rio de Janeiro, as vendas do produto, bem como camisetas com estampas da máscara, tiveram um aumento considerável em suas vendas.

O uso da bandeira do Brasil, por fim, é também bastante popular nas manifestações. A maioria dos manifestantes escolhe ir enrolado, utilizando a bandeira nacional como manto. Outros, no entando, apresentam um uso mais criativo, seja pintando no rosto as cores ou utilizando como bandana. Esses usos remetem a vários movimentos nacionalistas, como os próprios carapintadas, os movimentos pela paz ou até mesmo em torcidas durante campeonatos mundiais de futebol.
A moda mostra seu papel de identificadora e expositora de ideologias mais uma vez. Mesmo que inconscientemente para a maioria dos participantes, ela está presente neste momento histórico, e isso pode, e provavelmente irá, servir de inspiração para coleções de estações futuras.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Desinformação

Quinta-feira, dia vinte de junho. Enquanto mais de trezentos mil se preparavam para começar a maior manifestação da história do Rio de Janeiro, que ocuparia toda a avenida Presidente Vargas, lojas do bairro do Riachuelo, subúrbio carioca, fechavam as portas. Um boato de que um grupo de manifestantes vinha do Méier gerou pânico entre os comerciantes do bairro. Em um salão de beleza do mesmo bairro, a dona do estabelecimento estava em desespero, junto com a maioria de suas clientes. Uma das que manteve a calme, minha avó, me ligou, perguntando o que ela deveria dizer àquelas pessoas para que o pânico diminuísse. Minha primeira reação foi perguntar "Do que elas tem medo?". Naquela mesma quinta-feira, uma amiga da minha avó ficou apreensiva ao ouvir o boato de que o principal shopping da zona norte seria fechado por conta das manifestações, que seriam no centro da cidade.
"A desinformação é a maior inimiga de qualquer momento sério e importante, gerando desconfiança, boataria e até pânico."
O maior inimigo dos protestos não foi o governo contra o qual se protestava, nem a ação truculenta de policiais, nem a mídia acusada de ser tendenciosa. O problema era a desinformação. A Internet, por mais fácil que seja seu acesso, ainda não chegou a todas as pessoas - e não chegará tão cedo - fazendo com que a televisão e os jornais sejam seus únicos meios de informação. Antes de pensarmos se a mídia é tendenciosa ou não, temos que pensar nos benefícios de se obter informação por canais diferentes. Nenhum meio de comunicação é perfeito, e todos eles tem uma ideologia por trás de seus discursos. Para que se crie um censo crítico é preciso conhecer diversos discursos e então começar a entender e analisar cada um deles. A maioria das pessoas não teve, porém, a instrução necessária para chegar ao ponto de se tornarem leitores críticos. Essas pessoas, entretanto, não foram as únicas vítimas da desinformação.
Nas redes sociais, diversas notícias falsas foram espalhadas, como a de que a FIFA ameaçava cancelar a Copa do Mundo de 2014 caso as manifestações não parassem. Essa notícia poderia ser desmentida simplesmente com um clique no link da notícia, que levava a uma página dizendo justamente que se tratava de uma informação falsa. E não é a primeira vez que temos notícias inverídicas em meio a assuntos polêmicos. A desinformação é a maior inimiga de qualquer momento sério e importante, gerando desconfiança, boataria e até pânico.
Clicar nos links antes de que se compartilhe é o primeiro passo. Depois, ler o texto com atenção e, quanto mais impactante ou polêmico for, mais se deve procurar em outras fontes a confirmação. E aqueles com a sorte de terem se tornado leitores críticos devem, dentro de suas possibilidades, ajudar àqueles sem as mesmas oportunidades a entender o real contexto de qualquer situação. É trabalhoso, mas repassar informações é algo que exige muita responsabilidade e jamais deve ser feito levianamente.

terça-feira, 25 de junho de 2013

O Vilão Nosso de Cada Dia

Mais de 250 mil pessoas já seguem a página Felix Bicha Má no Facebook, pouco mais de um mês depois do início da novela Amor à Vida. O sucesso do personagem de Mateus Solano, apesar de tomar grandes proporções, já era esperado antes mesmo do início da obra. Não apenas pela polêmica de ser um vilão homossexual, ou pelo talento do ator, mas pelo fato de ser um vilão.
Felix, vilão de Amor à Vida: Sucesso no Facebook
Há um fascínio do público como um todo pelos malvados. Nas redes sociais e conversas sobre as novelas, geralmente são eles que tomam conta do assunto. Se algum personagem de uma novela entra para o imaginário popular, muito provavelmente ele é um vilão ou, pelo menos, foge do padrão politicamente correto. Lembramos da Dona Jura, de O Clone, ou do casal formado por Regina e Lima Duarte em Roque Santeiro, Viúva Porcina e Sinhozinho Malta; nenhum desses personagens era exemplo de moral e serenidade, mesmo não sendo vilões de suas tramas.
Entre os vilões mais lembrados, sempre se destacam aqueles criados por Gilberto Braga, em especial a histórica Odete Roitman, misteriosamente assassinada em Vale Tudo, novela de 1988. O sucesso da personagem interpretada por Beatriz Segall começa explicar os motivos desse encanto da audiência pelos vilões. Odete Roitman dizia atrocidades sobre o Brasil, num momento em que o país vivia um período economicamente conturbado. Muito do que ela dizia era aquilo que o povo tinha vergonha de dizer, até mesmo vergonha de pensar. Os vilões, então, falam por nós coisas que não podemos dizer.
Odete Roitman, vilã histórica de Vale Tudo
Também há um lado cômico na vilania, que traz o lado do deboche àqueles que não gostamos. A também histórica Narazé Tedesco, interpretada por Renata Sorrah em Senhora do Destino, contava com uma verdadeira lista de apelidos para diversos personagens da novela de Aguinaldo Silva. Um dos memes mais famosos da Internet também teve origem com uma vilã. Norma, interpretada por Carolina Ferraz em Beleza Pura, grita a plenos pulmões "Eu Sou Rica!", gerando uma fala histórica, mesmo que poucos saibam o contexto da cena em questão.
Até mesmo mocinhas de novela passaram a captar algumas características de vilões. Recentemente, o Brasil parou para ver a vingança de Nina sobre sua madrasta Carminha em Avenida Brasil. A heroína da trama, por muitas vezes, mostrou-se fria, calculista e manipuladora, e onde poderia se esperar uma rejeição do público, veio uma das novelas de maior sucesso da televisão.
Avenida Brasil trouxe os vilões para as redes sociais definitivamente, com diversas piadas, principalmente com Carminha. Seguindo o sucesso de João Emanuel Carneiro, veio Salve Jorge, de Glória Peres, quando vimos Cláudia Raia e  Totia Meirelles sendo personagens principais dos memes sobre a trama. Agora, temos Felix, com suas centenas de milhares de fãs no Facebook e fora dele. Foi necessário para todos esses atores talento e preparação para se tornarem vilões de uma novela do horário nobre, bem como talento e tempo para se desvencilhar desses personagens, que acrescentam tanto para suas carreiras e para a história das novelas brasileiras.